domingo, 23 de janeiro de 2011

Dose amarga



Há léguas de distância do último solstício de verão
que aconteceu a menos de um mês...
e deixou a sensação de jamais ter acontecido

Deserto

 cicatrizes
imperceptíveis
nas vagas idéias
de meus insanos mergulhos...

Me guardei tão bem
que quando me encontrei estava trancafiada
no fundo de uma arca perdida
 num oceano que desconheço

junto a mim
apenas
a idiota
sensatez
de quem um dia
achou
ser insensata

 lá esquecida
me esqueci
do que mesmo
?

a lua cheia

 eu transbordante
sem ter assim para quem transbordar
por que transbordar?
para que se derramar
se não haverá quem venha
me juntar

me suspendo
e ao suspender
pensamentos e sentimentos

me arrebento

......

e até a madrugada demora a chegar
custa a passar
 nela
ainda que em oníricos sonhos
de lua clara na janela
a bailar
ou em pesadelos arrebatadores
me reencontro
no palco
de ácidas  palavras
que criei
como quem faz
um castelo de cartas
para morar

labirinto

me perco
como tantas vezes já o fiz
e assim perdida
busco o gps de mim
mesma

Por mais que soubesse
o caminho a tomar
de nada adiantaria
não tenho o poder de guiar
esta nave desgovernada
de meus torpes sentimentos



Lêdo engano
querer se enganar
buscar se encontrar

Não há porta de saída
não há luz no fim do túnel

apenas
algumas nuances
pinceladas
cor de sol
de entardecer de um solstício
no trapo que resta de mim mesma

e tudo
me atormenta
batucada
descompassada
de meus vulgares
sentimentos

e sem ensaio
o samba
enredo
me confunde
por cima

da avenida de nome coração
impiedoso
passa
estonteante

Eu sou
real
mesmo
nada tendo de nobre
 e por ser
assim
acabo
por não caber

na fantasia
de ninguém
não sirvo
para santa
nem princesa
não sirvo
nem para
vilã
nem mocinha
cai no papel
errado
queria
a protagonista
e conduzi
e me tornei a melhor amiga

Ando na
contramão
sem me mover

tomei o rumo errado
Sem nada tomar

melhor seria
tomar veneno

não alcanço o volante
e como Alice
gigante
meus pés
não conseguem pisar
nos pedais


curvas
e mais curvas
nas emoções de mim mesma
e dos outros

Não arriscar-se
não vale
a pena


e assim observando tudo
vejo que não sou nada
 percebo que
neste torto mergulho
no tudo
jamais
caberei
na poesia de ninguém




Eu não valho nada!!
apenas o valor de uma engrenagem...
Um filtro de ar talvez...
sujo de tanta poeira das duras estradas que enfrentei
tendo ficado
 eu não valho
sequer a força da lâmina de
um bisturi enferrujado

eu não valho um trecho de música romântica brega...

ou por que sou demais
ou por que não consigo ser

e neste nada
é inevitável
não desejar dissecar
a mim mesma

Eu não tenho densidade
suficiente
para emocionar


sou um mergulho numa piscina vazia
de ilusões

Como posso ter o brilho das flores
se sou  como o mais reles capim seco?

Sem flecha de cupido
paramaltratar
sem dentes de vampiro
para me arrematar

Eu não sirvo para fertilizar
nem a mais torpe imaginação

Sou um grito agudo
calado
na madrugada
dos sonhos
que abandonei


eu não sou nada
mas nesta certeza
é que sei
que mesmo
em pedaços

sou e sempre serei

tudo
mesmo que
meu tudo
seja

apenas
este nada
este amontoado
de palavras
este amargor
que não podia
destilar

sou
assim
visceral
entorpecida
por natureza
carente de alma inteira

e desculpe se errei
na dose